"[...] Na istrada do disingano/andei de noite e de dia/inludido percurano/aprendê o qui num sabia [...]" (Elomar Figueira Melo. Desafio - Fragmento do quinto canto: Das violas da morte, do Auto da Catingueira)





quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Emir Sader: "A Novela de Trotski"

 
 
Bira Pimentel: com uma recomendação da envergadura de Emir Sader, como não comprar esse livro?
Muito já foi publicado sobre Leon Trotsky, desde a monumental trilogia de Isaac Deutscher, até o enfadonho e sonolento "the assassination of Trotsky". Toda a bibliografia Trotskista, contudo, é contundente na constatação de que o criador do Exército Vermelho foi quem, na prática, melhor compreendeu e implementou a teoria Marxista. O sanguinário Josef Stalin ordenou seu assassinato, mas jamais conseguiu calar a sua voz. Viva Trotsky, sempre!




Por Emir Sader. Recolhido do blog da Boitempo.

Trotski foi objeto daquela que é provavelmente a melhor biografia política jamais escrita: a trilogia de Isaac Deutscher sobre o “profeta armado”, o “profeta desarmado” e o “profeta no exílio”. Seu assassino foi protagonista de uma conhecida novela – A segunda morte de Ramon Mercader, de Jorge Semprun.
 
O surpreendente livro de Leonardo Padura, O homem que amava os cachorros, reúne história e novela, em tom policialesco, especialidade de Padura. O romance começa com um despacho da agência de notícias soviética Tass, datada de 22 de agosto, relatando que Leon Trotski havia morrido num hospital da Cidade do México, em consequência de uma fratura no crânio, resultado de um atentado perpetrado no dia anterior (na verdade havia sido dois dias antes, no dia 20 de agosto), “por uma pessoa do seu círculo mais próximo”.
 
Tratava-se, na verdade, de Ramón Mercader, um agente da polícia soviética, que conseguiu cumprir com sucesso a missão que lhe foi encomendada: a de matar o que a URSS considerava “um agente provocador”. Depois de ter participado da guerra civil espanhola, sua mãe, uma veterana militante do partido comunista da Espanha, o recrutou para os serviços secretos soviéticos. Em Moscou, ele foi preparado para missões especiais.
 
O livro de Padura intercala três histórias distintas que convergem para o conhecido e trágico desfecho. Além da trajetória de Mercader, acompanhamos o triste exílio de Trotski, até chegar ao México na tentativa de se proteger da KGB na casa que hoje é local de visitas turísticas, em Coyoacan – perto da casa de Fria Kahlo e Diego Rivera –, achando que poderia se defender com muros altos e uma guarita de observação.
 
A totalização dessas duas historias – a do Trotski e a do assassino, Ramón Mercader – é feita por uma terceira trama: a de um jornalista cubano que ouve o relato de um personagem misterioso na praia de Santa Maria del Mar (a mais próxima de Havana) – sobre alguém, que seria ele mesmo. O próprio Mercader dá sua versão da trajetória que o levou de militante comunista na Espanha a assassino de Trotski.
 
Essa trama tem como pano de fundo as versões da história exportadas da URSS à ilha de Cuba. Versões que não apenas desqualificam frontalmente a Trotski, mas que se deram no marco da censura da biografia de Deutcher aos cubanos, junto com o impedimento do conhecimento de grande parte dos densos combates de interpretação que povoaram o movimento comunista internacional durante décadas.
 
A leitura do livro não pode deixar ninguém impassível, tanto pelos dramas que envolve, quanto pelo estilo do relato de Padura, importado dos seus já consagrados livros que combinam pesquisa histórica e literatura policial. Ninguém sai da leitura como entrou. Afinal de contas, estão envolvidos no livro a guerra civil espanhola, a URSS, Trotski e o trotskismo, Cuba e sua revolução.
Está aí um livro para ler, refletir, se deliciar, presentear – a si mesmo e aos amigos. Bem escrito, lindamente editado e profundamente intrigante.

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