Por Luiz Nassif
A cada dia que passa vai se confirmando as hipóteses que tracei, anos atrás, para a politização exacerbada da velha mídia, o pacto espúrio de 2005 e a tentativa de vitimização constante, como se ela fosse o último reduto da democracia ameaçada pelas forças do mal. E, por forças do mal, vai-se da Conferência Nacional de Mídia a grupos empresariais que pretendem instituir a competição capitalista no setor.
A cada dia que passa vai se confirmando as hipóteses que tracei, anos atrás, para a politização exacerbada da velha mídia, o pacto espúrio de 2005 e a tentativa de vitimização constante, como se ela fosse o último reduto da democracia ameaçada pelas forças do mal. E, por forças do mal, vai-se da Conferência Nacional de Mídia a grupos empresariais que pretendem instituir a competição capitalista no setor.
Conseguiram levar o polêmico pastor Edir Macedo à prisão. Iniciou-se um amplo processo de criminalização dos evangélicos - cujo estilo empresarial em nada difere da mídia convencional. De nada adiantou.
Agora, o alvo é o grupo português Ongoing que resolveu investir em vários negócios no Brasil - e, especialmente, no território proibido da mídia. A manchete visa claramente criminalizar o grupo, ao dar destaque ao fato de que "Ministério Público investiga atuação do Ongoing no país". O MP apenas iniciou investigações a partir de uma representação da Associação Nacional dos Jornais (ANJ) sobre a origem do capital.
A matéria trata como "artifício" o fato da empresa Ejesa (Empresa Jornalística Econômico S.a) - que detém o título Brasil Econômico e adquiriu o grupo O Dia - estar em nome da esposa de Nuno Vasconcellos (principal cabeça do Ongoing), Maria Alexandra de Almeida Vasconcellos.
Ele é filha de pais portugueses, nascida no Brasil. Na matéria, seu pai José Carlos Sottomayor Negrão – que mora no Brasil desde antes do nascimento da filha – é apresentado como dirigente de uma empresa de locação e montagem de equipamentos para eventos.
Uma breve pesquisa na Internet, revela que é sócio de vários empreendimentos de peso, como a Novaagri Infra-Estrutura de Armazenagem e Escoamento Agrícola S.A., Proman (Produtores Energéticos de Manso). Em 18 de setembro passado, a Kepler Weber vendeu para a Novaagri o maior silo brasileiro. A empresa montou silos para atender à demanda da Ferrovia Centro-Atlântica, da Vale do Rio Doce.
Em 2001, a Proman tinha classificação Atlantica Rating de A+, o que lhe permitiu emitir R$ 37 milhões em debêntures nominativas conversíveis em ações. Posteriormente vendeu seu fluxo de caixa para Furnas, pelo pouco que pude apurar na pesquisa. Não sei sua situação hoje.
Pode ser que Sottomayor seja ponta de lança do grupo português, mas pode ser que tenha capital próprio - a matéria se limita a informar que é dono de firma de eventos.
O que se percebe é que há um grupo português forte – Nuno, Sottomayor, provavelmente o forte Banco do Espírito Santo – que decidiu investir pesadamente no país. São empresários de reconhecida competência, bala na agulha e com ampla experiência em produção televisa e de conteúdo jornalístico.
A tática da velha mídia de expor suas estratégias empresariais, dando tom de suspeição, poderá ser um tiro no pé, quando esse mesmo recurso for utilizado para devassar as estratégias empresariais, fiscais e políticas da velha mídia.
Folha de S.Paulo - Ministério Público investiga atuação do Ongoing no país - 01/12/2010
Procurador apura suposto artifício para burlar restrição a estrangeiros em veículos de comunicação
Associação de jornais acusa grupo português de controlar diário no Brasil mesmo tendo 29,9% do capital
ELVIRA LOBATO DO RIO JULIO WIZIACK DE SÃO PAULO
O MPF (Ministério Público Federal) de São Paulo abriu investigação sobre a atuação do grupo de mídia português Ongoing no Brasil.
A suspeita é que o grupo tenha usado de artifício para burlar a Constituição, que proíbe o controle por estrangeiros de jornais, revistas e emissoras de rádio e televisão no país.
O Ongoing entrou nesse mercado no final de 2009, com o lançamento do diário "Brasil Econômico". Em abril deste ano, comprou, por R$ 75 milhões, a empresa que publica os jornais "O Dia", "Meia Hora" e "Marca".
O Ongoing tem dado seguidas indicações, em Portugal, de que comanda as publicações no Brasil e de que pretende ampliar sua presença em mídia no país.
Executivos do grupo já anunciaram em Portugal a intenção de compra no Brasil de uma participação em uma emissora de televisão, o lançamento de um canal pago com conteúdo econômico e de um jornal em Brasília.
A Folha apurou que o grupo já fechou contrato com o "Jornal Alô Brasília" e pagará R$ 15 milhões por uma participação de 49%. O proprietário do jornal, Helio Queiroz não negou. "Tenho compromisso de confidencialidade. Não posso falar", disse.
O procurador Márcio Schusterschitz Araújo iniciou a investigação a partir de representação da ANJ (Associação Nacional de Jornais), que aponta indícios de que o Ongoing estaria violando o limite de 30% de participação estrangeira em meios de comunicação permitido pela Constituição.
A empresa Ejesa (Empresa Jornalística Econômico S.A.), que edita os jornais do grupo no Brasil, tem 70,1% de seu capital em nome da brasileira Maria Alexandra de Almeida Vasconcellos. Ela é mulher de Nuno Vasconcellos, presidente do Ongoing, que tem 29,9% da Ejesa.
O procurador quer saber a origem dos recursos investidos nos jornais. A Ejesa informou ao MPF que Maria Alexandra é casada com separação de bens, situação que indicaria ser dela o capital integralizado na empresa.
Filha de pais portugueses, ela deixou o Brasil para viver em Lisboa, aos 14 anos, quando os pais se divorciaram. O pai, José Carlos Sottomayor Negrão Mascarenhas, continuou no Rio de Janeiro, onde dirige uma empresa de locação e montagem de equipamentos para eventos.
Para a ANJ, há indícios de que o Ongoing controle a linha editorial dos jornais no país. O registro do capital em nome da brasileira seria artifício para ocultar o mando dos estrangeiros.
RESPALDO POLÍTICO
Durante duas semanas, a Folha rastreou a movimentação do Ongoing. As informações fornecidas por empresários, executivos e políticos no Brasil e em Portugal sugerem que o grupo foi estimulado por membros do PT a implantar no país uma rede de comunicação alinhada com o governo que diminuísse o poder dos grandes grupos privados.
O principal interlocutor do grupo com o governo é o ex-ministro e ex-deputado federal (cassado no escândalo do mensalão) José Dirceu, colunista do "Brasil Econômico". A namorada dele, Evanise Santos, é diretora de marketing institucional da Ejesa.
Ainda segundo a Folha apurou, o Ongoing usa serviços do escritório de consultoria de Brasília -JC&S Brasil Consultores- para ajudá-lo a buscar recursos para financiar seus projetos. Entre os alvos estão fundos de pensão estatais. O responsável pelo escritório, Júlio Silva, seria da confiança de José Dirceu.
APETITE EMPRESARIAL
No plano de mídia do grupo, a aquisição ou participação em uma emissora de TV é fundamental. Segundo a Folha apurou, o Ongoing tenta comprar os 29%, de Marcelo Carvalho na RedeTV!. O valor inicial seria US$ 300 milhões. Não houve avanço e o grupo prepara uma oferta de valor mais baixo.
O acionista da RedeTV! diz que "não tem negociação com Ongoing nem com undergoing (sic)" e que por essa cifra ele "nem pisca".
Enquanto negocia com a RedeTV!, o Ongoing também tenta convencer a Bandeirantes a fazer coproduções ou terceirizar parte de sua produção para o grupo.
O apetite por novos negócios levou o Ongoing a contratar Carmelo Furci -ex-executivo da Telecom Italia- e a Angra Partners. Ambos ficaram pouco tempo. Furci deixou a presidência do Ongoing em outubro e se recusou a falar da experiência.
Em julho, o grupo registrou o Ongoing Infraestrutura, que atuará na construção de estradas, ferrovias, aeroportos e que estuda uma participação no trem-bala.
Em outubro, foi criada a OnCasas, que fornecerá casas pré-fabricadas ao Minha Casa, Minha Vida. Antes de abrir a empresa, executivos doOngoing estiveram com o ministro das Cidades, Márcio Fortes, para vender a ideia.
Folha de S.Paulo - "Cumprimos integralmente a legislação", afirma empresa - 01/12/2010
DE SÃO PAULO
O Ongoing afirma que não existe nenhuma ligação com o governo brasileiro ou com partidos políticos. "Somos um grupo independente", disse a empresa em resposta enviada por e-mail às perguntas da Folha.
A companhia alega que "cumpre integralmente a legislação brasileira como, certamente, fazem todos os grandes grupos de mídia que atuam nesse mercado".
O grupo informou ainda que tem mais de 200 milhões em capital próprio, ativos de mais de 1,4 bilhão e endividamento bancário que não ultrapassa 600 milhões. Por razões estratégicas, o Ongoing não revelou resultados operacionais e investimentos futuros. A Ejesa negou a compra de 49% do "Jornal Alô Brasília".
O grupo confirmou que o canal de conteúdo econômico existente em Portugal pode ser uma área de investimento atraente para o grupo no Brasil e reforçou interesse na área da habitação social por meio da OnCasas.
Sobre a atuação do ex-deputado cassado José Dirceu, o Ongoing informa que não há relação. "Ele é apenas um dos colunistas do "Brasil Econômico.'" A empresa negou a existência de contrato no Brasil ou Portugal com a JC&S Brasil Consultores, pertencente a Júlio Silva, que seria da confiança de Dirceu.
A empresa não explicou por que contratou Evanise Santos, namorada de Dirceu, como diretora de marketing institucional da Ejesa. Consultada, Santos disse que foi funcionária do cerimonial do governo FHC e que foi contratada por sua experiência.
O Ongoing defendeu a contratação do deputado português Agostinho Branquinho com base em sua competência anterior à atuação como político.
Dirceu disse que não tem nenhuma relação profissional com o Ongoing e que tampouco faz intermediação de contatos com o governo.
GRUPO DE MÍDIA
Questionado sobre a acusação de que o PT e o governo Lula estimularam a vinda do Ongoing para criar um grupo de mídia em contraposição à grande imprensa nacional, Dirceu respondeu dizendo que a pergunta estava "prejudicada pelas duas primeiras respostas" [de que não trabalha para o Ongoing e de que não faz intermediação de contatos com o governo]. Usou a mesma resposta à pergunta sobre o suposto controle português na Ejesa.
Por telefone, José Sottomayor Negrão Mascarenhas, pai de Maria Alexandra, dona de 70% da Ejesa, considerou "ridícula" a acusação de que o dinheiro investido na empresa seria do Ongoing, pertencente ao seu genro.
Por e-mail, Mascarenhas, diretor da OnCasas, ressaltou que tanto a Ejesa quanto o Ongoing "têm meios de contato oficial". (EL e JW)
Folha de S.Paulo - Vasconcellos atua no país desde 2001 - 01/12/2010
Vasconcellos atua no país desde 2001
Presidente do Ongoing investiu em internet no Brasil e desistiu para voltar mais tarde com grupo de mídia
Empresário português fez empresas crescerem sustentadas por empréstimos; dívidas chegaram a 600 mi
DE SÃO PAULO
Não é a primeira vez que Nuno Vasconcellos, presidente do Ongoing, faz negócios no Brasil. Entre 2001 e 2008, ele tornou-se sócio da Arvitec, uma empresa de internet.
No auge dos investimentos pontocom no mundo, o empresário acreditava que o mercado brasileiro seria mais lucrativo do que o português. Juntou-se então a dois primos e investiu na empresa, fundada pela brasileira Delta de Negreiros.
"O Nuno é de uma família tradicional portuguesa, tem muitos contatos em empresas e no governo", disse Negreiros. "Tudo lhe interessa. Ele vê oportunidades em todos os lugares."
A Folha apurou que os contatos e o senso empreendedor levaram Vasconcellos para dentro da PT (Portugal Telecom), colocando o empresário no primeiro escalão dos executivos do país.
Em 2006, o Ongoing adquiriu cerca de 2% da operadora portuguesa, sendo praticamente financiado pelo BES (Banco Espírito Santo), maior acionista privado da PT. Naquela ocasião, a entrada do Ongoing na PT foi uma espécie de proteção, porque a operadora precisava de sócios contrários à proposta de compra da PT pelo grupo Sonae. Desde então, Ongoing e BES passaram a atuar como "núcleo duro" da PT.
Em 2010, esse núcleo perdeu a força com a proposta de 7 bilhões feita pela Telefónica para ficar com os 30% da PT no bloco de controle da Vivo. O Ongoing defendeu a venda. O negócio foi fechado por 7,5 bilhões e renderá 102 milhões em lucros somente ao Ongoing.
Antes do acerto final pela venda do controle da Vivo, o grupo também pressionou pela entrada da PT na Oi.
A Folha apurou que o Ongoing chegou a tentar contatos com os sócios privados da Oi. As negociações só começaram com a contratação do BES Investment para representar a PT, uma operação que isolou o Ongoing.
"ESTILO TRATOR"
Esse estilo controverso do grupo repetiu-se nas negociações com a Impresa, grupo de mídia de Francisco Pinto Balsemão, a quem pertence a emissora SIC, uma das três maiores audiências em Portugal.
Balsemão fundou a companhia em 1972 junto de Luiz Vasconcellos, pai de Nuno, e foi padrinho de casamento do filho do sócio.
Em 2010, o Ongoing passou a deter 22,4% da Impresa e tentou ampliar sua participação até 100%. Balsemão foi a público dizer que não abriria mão do controle.
A relação entre eles teria piorado quando Balsemão descobriu que, paralelamente, Nuno negociava a compra de 30% da TVI, pertencente aos espanhóis da Prisa, que atua em Portugal.
O negócio foi barrado pela autoridade portuguesa das comunicações porque, dentre outros motivos, daria ao Ongoing 75% do mercado publicitário em TV do país.
Especulava-se que o Ongoing estaria tentando entrar na TVI para se alinhar com o primeiro-ministro português, após a fracassada tentativa da PT em adquirir parte da emissora.
Uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) investigou a suposta interferência do governo em favor das duas empresas.
O primeiro-ministro, José Sócrates, considerava o telejornal noturno da emissora, líder de audiência em Portugal, um "telejornal travestido", destinado a promover a "política da calúnia" contra o governo.
O negócio com a emissora não deu certo e a CPI foi arquivada. Em seguida, Vasconcellos contratou José Eduardo Moniz, ex-diretor-geral da TVI, e o deputado Agostinho Branquinho, que integrou a CPI. Moniz será o responsável pelos negócios na área de televisão, inclusive no Brasil, e Branquinho será diretor do grupo no país.
Fernando Soares Carneiro, ex-administrador da PT, também foi contratado pelo Ongoing. Carneiro desligou-se da operadora após ter aplicado 75 milhões provenientes do fundo de pensão dos funcionários da PT em fundos de investimento do Ongoing.
DÍVIDA PARA CRESCER
Aos 45 anos, Nuno Vasconcellos começou a construir sua rede de relacionamentos na Andersen Consulting, onde permaneceu por oito anos. Depois abriu em Portugal uma filial da Heidrick & Struggles, uma das principais empresas caça-talento na Europa, em parceria com o espanhol Rafael Mora.
Em 2006, ele fundou o Ongoing, considerado por analistas um grupo muito alavancado (toma empréstimos para fazer investimentos).
Um balanço divulgado em 2008 indicou que o grupo tinha ativos de 1 bilhão e uma dívida de 834 milhões. A Folha apurou que o capital próprio era de 50 milhões. Hoje, a empresa diz possuir mais de 1,4 bilhão em ativos, a dívida não chega a 600 milhões, e tem 200 milhões em capital próprio.
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